Bolívia: Defender a vida é nossa missão, porque é a causa de Deus

A nação indígena Tsimane’ é de existência pré-colonial e a sua população se encontra dispersa na Amazônia boliviana, numa extensa área que se estende desde os últimos planaltos dos Andes até aos limites das savanas.

Por María Eugénia Carrizo

De acordo com o mapa político atual do Estado Plurinacional da Bolívia, o seu território inclui as províncias de Moxos, Ballivián e Yacuma, no departamento de Beni, e as províncias de Sud Yungas e Ixiamas, no departamento de La Paz. Este povo seminômade, de contato recente, vive da caça, da pesca, da colheita, da exploração de recursos florestais não lenhosos (palmeira jatata) e da agricultura, numa economia de subsistência em plena harmonia com a floresta.

Atualmente, de acordo com o último censo de 2012, sabe-se da existência de 164 comunidades, com uma população de cerca de 15.000 habitantes àquela altura, mas há muitos indícios de que existem outras comunidades Tsimane’ sobre as quais não há informação. O povo Tsimane’, por estar tão disperso, forma várias unidades territoriais e organizações orgânicas indígenas, uma das quais é a sub central Tsimane’ do setor Yacuma.

O território Tsimane’, no setor Yacuma, situa-se à direita da estrada Yucumo-Rurrenabaque, entre os municípios de São Borja e Rurrenabaque. Organizados em grupos de 7 ou 8 famílias, atualmente já estão estabelecidos em comunidades, algumas menores e outras mais numerosas, com até 70 famílias. O território habitado pelos nossos irmãos e irmãs Tsimane’ está sendo subjugado pelas decisões do INRA (Instituto Nacional de Reforma Agrária), que ignorou a pré-existência do povo Tsimane’, titulando a terra em nome de terceiros. Hoje, os indígenas Tsimane’ deste setor sofrem a expropriação forçada das suas comunidades, que os priva do seu território: fonte de abrigo, alimentação e espiritualidade, colocando-os em risco de etnocídio. A maioria do povo Tsimane’ fala apenas a sua própria língua, e muito poucos compreendem o espanhol e ainda menos conseguem exprimir-se neste idioma.

O Estado nunca esteve presente nos seus territórios para garantir o acesso aos seus direitos de identidade, educação e saúde. Estas realidades de isolamento e de não reconhecimento por parte do Estado fazem com que os irmãos Tsimane’ continuem desconhecendo a legislação territorial e os regulamentos relativos ao exercício dos seus direitos. De fato, seu território nunca foi reconhecido pelo Estado Plurinacional, que facilitou a entrada de concessões de exploração madeireira e, após a cessação do contrato, declarou este território indígena ancestral como terras públicas de livre acesso, favorecendo e promovendo a entrada de terceiros, mesmo com títulos de propriedade, gerando o conflito territorial que existe atualmente.

Ambição e a ganância humana

A isto se soma a ambição e a ganância humanas, os interesses mesquinhos que arruínam e ameaçam a vida. O tráfico de terras, a pilhagem de madeira, as violações sexuais, os abusos, o incêndio de casas, as mortes injustas, os subornos e as fraudes são o pão de cada dia na nossa querida Amazônia!

Nossos irmãos e irmãs do setor Yacuma reclamam o reconhecimento dos seus direitos ancestrais e, por conseguinte, a garantia de viverem em paz. Hoje as suas vozes clamam por justiça, clamam pelo direito de continuar a manter o seu modo de vida; clamam pelo respeito pela sua cultura e língua; clamam pela sua vida: identidade, respeito e compreensão.  Apesar de tudo, sorriem e riem, vivem a alegria e a esperança do Reino a partir de dentro.  Continuam a lutar e a manter a ilusão de que um dia a sua realidade será diferente e haverá justiça para eles, ou pelo menos para os seus filhos e netos: esta é a esperança que os mantém vivos. Será que um dia chegarão à Colina Sagrada, à Terra sem Males?

A nós cabe, na fé, confiar que Deus fará justiça ao seu povo, mesmo que os seres humanos recusem reconhecer a sua existência e os seus direitos. Mas, acima de tudo, nos cabe tomar o seu partido e responder à sua voz para que o seu grito nos ensurdeça, aqui na terra como no céu.

Calendário 2023: Guardiãs do Território

O Calendário “Mulheres da Amazônia 2023: Guardiãs do Território” confirma a sinodalidade e reflete sobre sua missão como mulheres defendendo a vida e lutando pela garantia dos direitos para as gerações futuras.

Este tema é expresso através da arte da fotografia com o testemunho de mulheres defensoras do território. Suas narrativas devem nos inspirar, gerando espaços para compartilhar vida e ações, e que estas gerem vida e transformação.

Clique aqui para acessar o calendário: Calendário 2023: Mulheres da Amazônia, Guardiãs do Território – Repam

Fonte: REPAM/Traduzido pelo Ir. Hugo Bruno Mombach, FSC