Defesa da vida, do território e das fontes de água: reflexões durante a escola de Direitos Humanos

Iniciada no último dia 4 de agosto, a quarta edição da Escola de Direitos Humanos da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM) chega à sua primeira semana de atividades com sérias reflexões sobre o valor do território amazônico e daqueles que o habitam. A defesa das fontes de água e das extensões da floresta amazônica são as motivações dos participantes do espaço, que compreendem a relação de harmonia existente entre as comunidades e o território.

Por: Equipe de Comunicação REPAM

O diálogo da primeira parte da escola manifestou a necessidade de alimentar as lutas pela Amazônia com raízes culturais e espirituais. Ouviram-se testemunhos de sofrimento como consequência dos ataques ao território e às famílias que o habitam. Os participantes esperam que este espaço de acompanhamento possa levar esperança às comunidades amazônicas e um sinal de solidariedade entre os povos.

A mineração e seu avanço destrutivo

No início da IV Escola de Direitos Humanos da REPAM, foi colocado em pauta um exemplo do que envolve a extração de minerais no território Pan-Amazônico. Na bacia do Orinoco, mencionou-se que há cenários bastante complexos envolvendo as jurisdições do Brasil, Colômbia e Venezuela. Ali, a mineração não apenas gera um grave impacto ambiental — ao contaminar fontes de água e hectares de floresta com insumos tóxicos como mercúrio e cianeto — como também cria um cenário de violações de direitos fundamentais, tanto individuais quanto coletivos, das comunidades.

Uma das duplas de representantes da Colômbia apresentou a iniciativa de um projeto de lei que busca declarar o rio Putumayo como sujeito de direitos. À frente do processo estão povos indígenas, organizações sociais e camponesas do Putumayo, que levam essa proposta ao Congresso da Colômbia. No início do século XX, neste território, as comunidades indígenas foram massacradas pela exploração da borracha, da quina e da madeira; anos depois, chegou a exploração petrolífera. Para os povos, trata-se de ciclos que se repetem. Mais uma vez, busca-se explorar os recursos naturais.

Na parte alta da Amazônia, no maciço colombiano onde nascem os rios, existem títulos minerários e há entrada de multinacionais que solicitam extensões muito amplas para exploração de cobre e ouro. Em Mocoa, há um depósito cuja exploração ameaça o maciço colombiano — uma confluência na Cordilheira dos Andes onde se gera 70% da água doce e nascem os rios Caquetá e Putumayo. Atualmente, há quatro títulos minerários que são fortemente rejeitados. Ainda assim, apesar desses esforços, as autoridades insistem em seguir com o processo.

O rio Putumayo é ameaçado pela mineração em sua parte alta. Nas bacias média e baixa, persiste o problema da exploração petrolífera. Os povos que vivem ao redor do rio estão perdendo o direito à água. “Foram gerados títulos e concessões minerárias sem consultas prévias aos povos. Existem sentenças da Corte Constitucional que não foram cumpridas. A atividade extrativista gera consequências muito graves. Não podemos permitir que essas práticas se repitam justamente onde nasce a água”, sentenciou um dos participantes da Colômbia.

Terra e comunidades amazônicas

O caso do povo Nawa (ou Nahua) do município de Cruzeiro do Sul, no estado do Acre, foi apresentado no espaço da escola como um exemplo da sobreposição da administração dos nossos governos à autonomia indígena. Os representantes desse povo indígena relataram que foi criado um parque nacional sobre seu território; há mais de 25 anos lutam pela demarcação da área para que seja reconhecida como território indígena pelo Estado. Atualmente, vivem próximos à fronteira com o Peru. Vale destacar que o povo Nawa ou Nahua faz parte do grupo Pano; no corredor fronteiriço entre Brasil e Peru, existem grupos desse povo em situação de isolamento voluntário e de contato inicial.

Da Colômbia, foi apresentado o caso da zona da Reserva Camponesa La Guardiana del Chiribiquete; ali convivem 2.064 famílias camponesas, 104 famílias indígenas e 44 famílias afrocolombianas. A produção agrícola é fundamental para a subsistência dos habitantes da zona de reserva; por isso, foi criada uma mesa técnica de trabalho que promove a transição de uma produção baseada em agroquímicos para uma totalmente orgânica. Ainda assim, os representantes da Colômbia denunciaram a indiferença por parte das instituições estatais “para o estado colombiano, somos apenas ocupantes da terra”, manifestaram.

Desenvolvimento a partir dos povos

Em um debate em grupos, falou-se sobre as formas de alcançar o desenvolvimento a partir da experiência dos povos que habitam a Amazônia. Os participantes citaram formas de produção econômica compatíveis com o cuidado da natureza e que permitam alcançar a soberania alimentar e nutricional. Houve consenso de que a proteção permanente do território e dos recursos naturais é fundamental. Também foi ressaltada a necessidade de governos próprios nas comunidades indígenas e de que os Estados garantam direitos fundamentais como saúde, educação com preservação das línguas ancestrais, espiritualidade e os modos de vida dos povos, mantendo suas culturas próprias.

Destacou-se a consulta prévia como um direito já estabelecido; além disso, ressaltou-se que as mulheres são as guardiãs das florestas e das culturas ancestrais. Na área da saúde, persiste o reconhecimento do valor dos conhecimentos tradicionais e a necessidade de harmonização com as práticas dos centros de saúde, sem discriminação. “Hoje estamos tecendo uma nova rede na Pan-Amazônia, fazendo uma transferência de saberes. Essa coragem com que muitos de vocês têm defendido seus territórios inspira a não ficarem parados, a não desistirem — devemos apostar em um desenvolvimento em escala humana”, manifestou-se como reflexão do espaço de construção de conhecimento.

Foi ecoado o conceito de “Floresta Viva”, que abrange todos os espaços. “A floresta fala, todos falam: as árvores, os rios… os animais. Somos os donos e fomos usados como trabalhadores braçais. Todos lutamos pelo mesmo objetivo: a proteção e a segurança dos territórios onde vivemos”, concluíram.

11 de agosto de 2025