
Um primeiro estudo impulsionado pelo Centro de Inovação Científica Amazônica (CINCIA), em colaboração com a Sociedade Zoológica de Frankfurt Peru, e que contou com entidades como a Universidade Nacional Amazônica do Peru (UNAP) e o Instituto de Pesquisas da Amazônia Peruana (IIAP) para a análise das amostras, determinou o panorama da contaminação por mercúrio em espécies de peixes e em moradores de seis comunidades da região de Loreto.
Por: Equipe de Comunicação da REPAM
As comunidades nas quais foram coletadas as amostras para análise e posterior estudo foram Mishana e Anguilla, no Baixo Nanay; Santa María de Nanay e Diamante Azul, no Alto Nanay; e San Juan de Raya e San Antonio, no rio Pintuyacu. Vale destacar que as jurisdições dessas comunidades incluem territórios dentro de áreas naturais protegidas, como a Reserva Nacional Allpahuayo Mishana e a Área de Conservação Regional Alto Nanay-Pintuyacu-Chambira (Nanay).
Os resultados das amostras coletadas entre os moradores confirmaram uma situação recorrente na Amazônia: o excesso de mercúrio nos níveis encontrados em populações de diversos territórios. A dieta com consumo regular de peixe, que representa em grande parte a principal fonte de proteína, seria um dos fatores de contaminação por mercúrio na região. Os tipos de peixes analisados apresentaram, em sua maioria, níveis aceitáveis de mercúrio; no entanto, um grupo apresentou índices muito acima do limite estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), destacando-se entre eles: Paña Negra, Lisa, Huapeta, Mota Punteada, Bocón, Chambira, Lince, Paña e Maparate.
Números preocupantes
Os resultados das amostras em humanos revelaram dados alarmantes. A OMS estabelece que o limite seguro de presença de mercúrio no corpo humano é de 2,2 mg/kg; no entanto, as análises realizadas na população da região indicaram níveis de mercúrio entre 0,63 e 27,34 mg/kg. No caso de crianças entre 0 e 4 anos, os níveis variaram entre 6,31 e 20,70 mg/kg, com um valor médio de 12,99 mg/kg. Já entre mulheres em idade reprodutiva (15 a 49 anos), os níveis de mercúrio ficaram entre 1,99 e 20,19 mg/kg, com uma média de 8,31 mg/kg.
O estudo aponta que “Loreto é a região com o maior consumo per capita de peixe do país (Peru). Em comunidades indígenas, onde o peixe representa a principal fonte de proteína, o risco de exposição ao mercúrio pode ser ainda maior.” Isso se deve ao fato de que, apesar das diversas condições de instabilidade da biodiversidade e da perda de condições adequadas para a criação de peixes, o consumo de pescado segue dinâmicas ancestrais que hoje estão sendo impactadas pela contaminação.
Deve-se considerar que, em mulheres grávidas, segundo o estudo mencionado, “o metilmercúrio atravessa a placenta e pode afetar o desenvolvimento neurológico do feto, bem como o das crianças em crescimento, que são mais suscetíveis aos efeitos neurotóxicos do mercúrio, o que pode provocar déficits cognitivos, alterações motoras e dificuldades de aprendizagem”.
Um panorama comum
Os dados apresentados sobre este território da região de Loreto confirmam uma situação recorrente em outras áreas da Pan-Amazônia. No caso de Madre de Dios, na Amazônia peruana, diversos estudos realizados com a população local revelam níveis excessivos de mercúrio; é claro que o departamento de Madre de Dios é uma zona fortemente impactada pela mineração, e as quantidades de mercúrio no ar e na água são medidas em toneladas.
Nas florestas de Ucayali e Cusco, encontra-se a Reserva Territorial Kugapakori-Nahua-Nanti, uma área habitada por povos isolados e em contato inicial. Nesse caso, a população nahua de Santa Rosa de Serjali (dentro da referida reserva) sofre com uma contaminação extrema por mercúrio, apresentando um panorama muito semelhante ao das zonas do Nanay e Pintuyacu: territórios sem grande exploração mineradora, mas onde os níveis de mercúrio na população ultrapassam os limites estabelecidos.
A mineração é, atualmente, a atividade que mais gera contaminação; a ela estão associadas o desmatamento, o narcotráfico, a poluição do solo e das fontes de água e até mesmo a violação de direitos fundamentais. Os níveis de mercúrio aumentam com a presença da mineração — atividade que, por ora, é incipiente nas zonas do Nanay e Pintuyacu. Mas qual seria o cenário se essa atividade aumentasse? Que impacto teria em uma população que, mesmo no contexto atual, já apresenta níveis elevados de mercúrio?